Em nossas consultorias, não é raro encontrar executivos, afirmando: “Não somos uma empresa de tecnologia!”. Geralmente, essa afirmação surge em discussões sobre investimentos ou quando processos estão sendo revisados e ajustados. Trata-se de uma afirmação ingênua e perigosa.
Comecemos pela ingenuidade!
Qualquer atividade, em qualquer organização, de qualquer ramo ou segmento, demanda, em maior ou menor escala, a utilização de sistemas de informação. Logo, excelência tecnológica, mesmo para empresas onde a receita não seja proveniente dela, é uma característica fundamental.
Independente de uma empresa ser de tecnologia ou não, recursos tecnológicos podem ser usados para maximizar e materializar resultados, desde que usados do jeito certo. Isso não significa adotar “a melhor tecnologia de todos os tempos da última semana”, mas, no lugar disso, encurtar caminhos com agilidade, cultura lean e DevOps. O objetivo deve ser preservar a eficiência, frente às mudanças de escala, ao longo do tempo.
Benefícios como automações, integrações com fornecedores e parceiros, comunicação direta com clientes são apenas algumas das características de empresas bem sucedidas. Todas essas capacidades, para serem eficazes e eficientes, dependem do uso correto de recursos tecnológicos.
Empresas que não dão atenção à competência tecnológica, mesmo não sendo de tecnologia, acabam sempre às voltas com soluções legadas, iniciando projetos gigantes de atualização tecnológica que geralmente falham. No fim, mesmo os sucessos eventuais acabam ofuscados por gastos difíceis de justificar, principalmente porque muitas das soluções desenvolvidas já nascem tão defasadas quanto aquelas que estão substituindo.
A afirmação “Não somos uma empresa de tecnologia” favorece a crença de que competências tecnológicas são menos importantes, exatamente em um tempo onde o digital está revolucionando a competição e, por isso, mesmo ignorado, invade a agenda de discussões.
Avancemos, agora, para o perigo!
Empresas que desprezam a tecnologia, tratando-a como tema periférico, acabam não percebendo oportunidades de construir vantagens competitivas duradouras. Ou ainda, implementar otimizações em processos e atividades que refletem em melhor desempenho operacional.
Boa parte da “disrupção” que encontramos no mercado é habilitada pelo desacoplamento da cadeia de valor do cliente. Isso é possível graças ao uso de tecnologia. Foi assim com a indústria do cinema, pelos serviços de streaming. Tem sido assim com serviços bancários, seguros, transporte, varejo, habitação e muito mais.
A excelência tecnológica que tem fomentado inovações em modelos de negócios, mercadológicas ou em processos. O uso da tecnologia tem feito emergir novos players em mercados consolidados e, também, sucumbir empresas que eram aparentemente sólidas.
Terceirizar a competência tecnológica a fornecedores foi, e ainda é, um erro grosseiro que costuma custar muito caro. Algumas vezes, empresas saudáveis tornam-se “reféns” de fornecedores que praticam preços arbitrários, ou deixam de atender demandas urgentes. Outras vezes, acaba-se perdendo o compasso com mudanças de modelos de negócio que carecem de “intimidade digital”.
“Não somos uma empresa de tecnologia” é uma afirmação forte e, cada vez mais, deslocada da realidade. Na medida em que a tecnologia se torna sufixo dispensável (marketing digital, RH digital, venda digital, educação digital, transformação digital) tal afirmação pode ser lida como “Não somos uma empresa”.
Se você faz parte do grupo de executivos que afirma, frequentemente, “Não somos uma empresa de tecnologia!”, cuidado! Eventualmente, a persistência nessa crença pode tornar você e sua empresa irremediavelmente obsoletos (e dispensáveis).