Sob uma perspectiva teológica, há um episódio curioso, no Antigo Testamento, que sempre volta quando penso na ideia de camadas da realize. Do mundo Espiritual e do mundo Material. Está descrito em 2 Reis 6, com Eliseu.
A cidade está cercada. O exército inimigo chegou durante a noite. Quando o servo de Eliseu acorda e vê a situação, entra em pânico. A leitura que ele faz da realidade é direta, objetiva, correta do ponto de vista físico: estamos cercados. Não há saída. O ataque é iminente.
Eliseu não discute os fatos. Não diz que o perigo é imaginário. Não propõe uma estratégia alternativa. Ele faz algo estranho. Ora. E o pedido é simples: “Senhor, abre os olhos dele para que veja.”
Quando os olhos do servo se abrem, ele vê o mesmo lugar. As mesmas montanhas. A mesma cidade. Mas agora há algo mais. Cavalos e carros de fogo ao redor. Eles não chegaram depois. Já estavam lá. O que mudou não foi a realidade. Foi o nível de leitura.
O mundo físico mostrava cercos, lanças, ameaça. O mundo espiritual mostrava sustentação, governo, limite.
Esse texto não sugere fuga do real. Pelo contrário. Ele mostra que o real pode ser lido de forma rasa ou profunda. O servo não estava errado. Ele só estava vendo pouco. A visão espiritual não negou o que era visível. Ela contextualizou.
Talvez seja isso. O problema não é perceber o que acontece. É achar que isso é tudo o que há para perceber.