Jeremias 48 é o terceiro oráculo contra as nações estrangeiras e o mais longo deles. Isso não é detalhe editorial. Moabe não é um povo qualquer. É descendente de Ló, sobrinho de Abraão. Parente próximo de Israel. A relação entre os dois sempre foi ambígua: vizinhança, rivalidade, comparação constante. Quando Moabe cai, não é um estranho que é julgado. É alguém da família.
A extensão do capítulo reflete essa intimidade histórica. Moabe acompanhou Israel de perto. Viu Jerusalém ruir, o povo ser levado ao exílio, e interpretou sua própria estabilidade como sinal de superioridade. O orgulho de Moabe nasce daí. Não de força momentânea, mas de conforto prolongado. O vinho que nunca foi trasfegado conservou o sabor, mas também endureceu. Nunca houve crise suficiente para gerar revisão.
Jeremias não anuncia apenas uma derrota militar. Ele desmonta uma teologia equivocada: a ideia de que estabilidade é prova de acerto. Por isso o texto é longo, insistente, quase doloroso. E o profeta não comemora. Ele chora. Juízo, aqui, não é prazer. É correção.
E, ainda assim, o capítulo termina com uma promessa de restauração. Proximidade não imuniza contra o juízo. Mas também não elimina a misericórdia. Parentes caem mais alto. E, curiosamente, não são esquecidos com facilidade.