Aprendi com o professor Clóvis de Barros sobre Bourdieu. Um explicador genial, para um gênio que, para mim, definitivamente precisa ser explicado.
Bourdieu é hermético. Tem um vocabulário próprio. Um dicionário inteiro de conceitos que, à primeira vista, parecem fechados demais. Mas quando abertos, revelam um modelo poderoso para compreender o mundo social.
Hierarquias não são naturais. São construídas. Sustentadas. Disputadas. O que chamamos de mérito é, muitas vezes, a ilusão naturalista que esconde estruturas de privilégio.
A vida social é feita de campos. No acadêmico, no político, no profissional. Cada campo tem suas regras, suas fronteiras, sua história. E em cada campo, agentes ocupam posições sociais definidas pelo volume e pela composição de capitais.
Capitais podem ser econômicos, culturais, sociais ou simbólicos. Mas não basta possuí-los: é preciso saber mobilizá-los. O networking é a prática de ativar o capital social, convertendo relações em oportunidades. Os troféus — prêmios, cargos, títulos — são símbolos de consagração, legitimados por instituições que funcionam como circuitos de reconhecimento.
A dominância nunca é gratuita. Precisa ser conquistada e mantida. Quem está no topo tende ao conservadorismo: deseja preservar as regras que lhe garantem superioridade. Mas nenhum campo é estático. Há sempre conflito, disputa, reconfiguração. O consenso é apenas aparente.
O habitus dá a cada agente um sentido prático. É o conjunto de disposições que carregamos no corpo e na mente. O habitus primário, formado na infância, é a base duradoura. O habitus secundário, adquirido na escola, no trabalho, nos grupos sociais, ajusta ou tensiona essa base. O habitus de classe faz com que famílias diferentes cultivem disposições distintas — gostos, estilos de vida, aspirações. Até o habitus político molda nossa relação com a participação e com o voto.
A doxa é o invisível. São as crenças que parecem óbvias, naturais, mas que são construídas socialmente para sustentar desigualdades. A legalidade e a opinião pública operam da mesma forma: mecanismos simbólicos que transformam arbitrariedades em verdades universais.
Até o voto, Bourdieu explica, não é escolha racional pura. É o encontro entre disposições sociais e a oferta do campo político. Não decidimos sozinhos. Decidimos a partir de posições, de capitais, de habitus.
O curso foi incrível. Doze aulas curtas, cada uma com menos de vinte minutos, conseguiram condensar tudo isso com clareza e rigor. Clóvis foi generoso. Pegou pela mão, explicou sem simplificar demais, fez ver o que estava escondido.
Bourdieu modela o mundo de forma única. Compacta. Coerente. Mas o professor Clóvis, bom, esse consegue explicar definitivamente qualquer coisa. Sonho ser algo próximo dele um dia.