Começando o dia com Salmo 89 que é um lamento, mas não apenas isso. É o grito daquele que ainda espera, daquele que acredita numa promessa que não se cumpriu — ainda.
É um texto imerso na tensão entre aquilo que foi prometido e o que ainda não aconteceu, a vivência cristã entre o “já” e o “ainda não”. Este é o Salmo da fé ativa, que persiste mesmo no silêncio aparente.
Aqui, fé não é emoção religiosa passageira. É postura firme, é disciplina constante.
O salmista não demonstra resignação passiva.Ele age, clama e permanece firme,não porque já vê a promessa cumprida, mas porque acredita que essa promessa continua sendo feita.
Há no texto uma consciência madura da dependência, longe de uma fé infantil ou fuga emocional. É o reconhecimento lúcido e necessário da relação entre Criador e criatura.
Mesmo sem compreender plenamente os planos divinos, o salmista permanece firme, sem recuar. Reconhece humildemente a limitação humana diante da Graça divina, que muitas vezes se manifesta no escuro, longe dos nossos olhos.
Neste contexto, oração e louvor surgem como sustentação, práticas essenciais que mantêm a fé viva. E quando estas práticas parecem falhar, o lamento sincero também é legítimo, pois a fé verdadeira não nega a dor nem finge plenitude quando o coração está partido.
Sob uma perspectiva mais racional, talvez as promessas divinas sejam compatíveis com as leis naturais — como afirma Espinosa, um sistema revela seu propósito pelo que faz, não apenas pelo que diz.
Assim, a linguagem religiosa se torna uma forma de nomear aquilo que já ocorre. Nesse sentido, a promessa de Deus não foi feita apenas uma vez: ela é continuamente reafirmada, inclusive agora.
Perceber Deus como uma entidade que promete no tempo é, portanto, uma simplificação didática válida, que ajuda a crer e a continuar caminhando.
Existe risco na racionalização excessiva da fé? Certamente. Mas este é um risco consciente e necessário. Uma fé verdadeira suporta questionamentos e cresce com vigilância constante.
Respeitar quem crê de maneira diferente ou quem não crê também é essencial, não porque todas as crenças sejam igualmente válidas, mas porque a convivência saudável exige espaço para a diferença.
Salmo 89 revela claramente que promessa e ação caminham lado a lado. Não se trata de esperar com passividade. O salmista aguarda agindo, perseverando e mantendo-se fiel, porque uma vida alinhada à ordem divina cria naturalmente as condições para o cumprimento da promessa.
Não por mágica, mas por coerência espiritual e ética.